Como compreender, acolher e simbolizar o que não está mais
Introdução
Em meio às festas referenciais da civilização moderna — como Natal, Ano Novo, aniversários, datas comemorativas e ritos de passagem — muitas pessoas vivenciam um sentimento difícil de nomear: o silêncio da ausência. É o lugar vazio à mesa, a mensagem que não chega, a voz que não responde mais. Esses momentos, socialmente marcados como celebrações, tornam-se também espelhos simbólicos das perdas, revelando ausências que o cotidiano costuma silenciar.
Este artigo propõe um ensaio simbólico‑psicanalítico, com linguagem simples e acessível, para ajudar a compreender como a ausência e seu silêncio operam no psiquismo humano — e como ritos, espiritualidade e simbolismo podem auxiliar na assimilação dessas experiências.
1. A ausência que fala
Na psicanálise, ausência não significa vazio absoluto. Ao contrário: o que falta continua presente no campo psíquico. Quando alguém se vai — por morte, separação, afastamento ou transformação — sua presença é reorganizada como memória, afeto, símbolo e desejo.
O silêncio da ausência não é apenas a falta de som ou de palavras. É:
o que não pode mais ser dito àquele que se foi;
o gesto cotidiano que perdeu destinatário;
a expectativa que não encontra resposta.
Assim, o silêncio não é o oposto da presença, mas uma outra forma de presença.
2. Festas modernas como espelhos do luto
Datas simbólicas intensificam a percepção da ausência. O Natal, por exemplo, carrega ideais de união, família e continuidade. Quando alguém falta, a festa deixa de ser apenas celebração e torna-se também rito involuntário de luto.
Esses momentos revelam algo fundamental:
Não sofremos apenas pela perda em si, mas pelo contraste entre o que deveria estar presente e o que não está.
A civilização moderna, marcada pelo excesso de estímulos e pela obrigação da felicidade, muitas vezes nega o espaço legítimo do silêncio, tornando o sofrimento mais solitário.
3. O silêncio como experiência psíquica
3.1 O silêncio que elabora
Existe um silêncio saudável, necessário, que permite:
assimilar a perda sem pressa.
Esse silêncio não pede explicação imediata. Ele é tempo interno de amadurecimento.
3.2 O silêncio que aprisiona
Quando a ausência não é simbolizada, o silêncio pode se tornar pesado, repetitivo, paralisante. Em vez de elaborar, o sujeito gira em torno da falta, tentando preenchê‑la compulsivamente ou negá‑la.
Aqui, o silêncio deixa de ser espaço e torna‑se prisão.
4. Espiritualidade: quando o silêncio ganha sentido
As tradições espirituais sempre souberam algo que a modernidade esqueceu: o silêncio é linguagem sagrada.
Nas vigílias, nos minutos de recolhimento antes de um rito, nas velas acesas em memória dos ausentes, o silêncio não é ausência de vida, mas presença do invisível.
Independentemente de crença religiosa, práticas espirituais ajudam a:
reconhecer a ausência sem negá‑la;
transformar o silêncio em memória viva.
5. O papel dos ritos
Ritos existem para aquilo que não cabe em palavras. Na civilização moderna, muitos ritos foram esvaziados, mas ainda sobrevivem de forma espontânea:
repetir uma frase, uma música, um gesto.
Esses atos simples ajudam o psiquismo a compreender que:
O que se foi não desapareceu — mudou de lugar.
O rito não elimina a dor, mas organiza o silêncio, tornando‑o habitável.
6. Como assimilar o silêncio da ausência
De forma prática e simbólica, assimilar a ausência envolve:
Aceitar que algo não será respondido;
Permitir o silêncio sem culpa;
Não apressar o sentido;
Reconhecer que certas ausências permanecem.
Assimilar não é esquecer. É aprender a viver com o que não está mais, sem negar a própria vida.
Conclusão
O silêncio da ausência não é um erro emocional, nem uma falha espiritual. Ele é parte do processo humano de amar, perder e seguir vivendo.
Nas festas, nos ritos e nos momentos de recolhimento, esse silêncio pode se tornar um espaço de reconexão, onde memória, afeto e sentido encontram nova forma.
Quando aprendemos a escutar o silêncio, a ausência deixa de ser apenas dor — e passa a ser também sabedoria.

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